Há dois anos faleceu meu pai, Alfredo Palermo. Há pouco, participamos, Fernanda e eu, além de alguns parentes e amigos, da celebração eucarística na Catedral de N. S. da Conceição, atinente aos dois anos de sua morte.Trata a presente, pois, de um comentário próprio para meu Blog, um espaço restrito a abordagens sociais e certamente lido por um pequeno círculo de amigos, os quais estão acostumados ao teor das manifestações. Um poema de Antônio Cícero, intitulado "Guardar" (in Os cem melhores poemas brasileiros do século. Seleção: Ítalo Moriconi. São Paulo: Objetiva, 2001. p.337), explica esta necessidade que sinto ao lembrar de meu pai, neste dia:
Guardar uma coisa não é escondê-la ou trancá-la.
Em cofre não se guarda coisa alguma.
Em cofre perde-se a coisa à vista.
Guardar uma coisa é olhá-la, fitá-la, mirá-la por admirá-la, isto é, iluminá-la ou ser por ela iluminado.
Guardar uma coisa é vigiá-la, isto é, fazer vigília por ela, isto é, velar por ela, isto é, estar acordado por ela, isto é, estar por ela ou ser por ela.
Por isso melhor se guarda o vôo de um pássaro
Do que um pássaro sem vôos.
Por isso se escreve, por isso se diz, por isso se publica, por isso se declara e declama um poema:
Para guardá-lo:
Para que ele, por sua vez, guarde o que guarda:
Guarde o que quer que guarda um poema:
Por isso o lance do poema:
Por guardar-se o que se quer guardar.
Justamente, no dia de hoje, o tema da celebração tratava da Sagrada Família. Além disso, abordava o sentido exato de um dos mandamentos, que é honrar pai e mãe ! Quem conheceu de perto meu pai, sabe que ninguém foi tão dedicado à família, no seu sentido correto, além de exercer dignamente as atividades laborais, a ponto de ser a maior liderança intelectual em seu tempo. Sem falso cabotinismo, sua trajetória foi marcante: na área educacional exerceu por longos anos a cátedra da disciplina de português, em escola pública, cativando seus alunos pela maneira culta e objetiva que dominava a matéria. Também, na área educacional tornou-se a pessoa que mais contribuiu para a difusão do ensino universitário da cidade. Senão, lembremos: criou, junto à uma escola particular, da qual foi sócio (o Ateneu Francano), o curso de Ciências Econômicas, que foi o embrião da atual UNIFACEF; criou os cursos de Estudos Sociais e Letras, os quais foram embriões para o início da Unifran. Foi, ainda, quem instalou os cursos da antiga Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Franca, instituto estadual isolado, a qual veio e se tornar o atual campus da Unesp-Franca. Não bastasse isso, foi o segundo diretor da Faculdade de Direito de Franca, órgão municipal, sendo em suas gestões consolidada a faculdade com a construção do atual prédio em que funciona, propiciando ainda a mesma se tornar uma da melhores do Estado de São Paulo. Para culminar, é lembrado com carinho e admiração na cidade de Ribeirão Preto, pelo longo período em que lecionou disciplina jurídica nas Universidades Mauá, Moura Lacerda e Unaerp. Sua ligação cultural com Ribeirão possibilitou ser membro atuante da Academia Ribeirãopretana de Letras. E, ainda, anos depois, fez parte do grupo que fundou a Academia Francana de Letras, da qual também foi membro atuante.
Não parou por aí, sua fome de cidadania permitiu ser uma dos mais fervorosos componentes do Rotary Club de Franca, do qual também foi Governador.
Na área jornalística foi redator por um período e colaborador durante mais de 60 anos do jornal Comércio da Franca, uma de suas paixões e do qual foi das figuras mais destacadas, dando brilho especial nas suas crônicas.
Foi, ainda, por um período, deputado federal, destacando-se na tribuna da Câmara em época de ouro, onde figuravam políticos de estirpe como Carlos de Lacerda, Franco Montoro, Juarez Távora, etc.
Na área jurídica, mercê de sua oratória e cultura, foi brilhante em defesas memoráveis no Tribunal do Júri.
É o autor da letra do Hino da Franca. E, também, do Hino da Padroeira, N. S. da Conceição.
Ou seja, uma legenda cultural e histórica da cidade que tanto amou.
E é essa pessoa que, passados dois anos, ainda está viva em minha memória e que guardo com carinho pela honra de tê-lo como pai e mestre, em todas as fases de minha vida e a quem, novamente, presto minhas homenagens.
Isto me faz lembrar um poema de Mário de Andrade:
Quando eu morrer quero ficar,
Não contem aos meus inimigos,
Sepultado em minha cidade,
Saudade.
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