domingo, 9 de dezembro de 2018

O inatingível e ditatorial Supremo

Quando se aborda algo sobre o Supremo Tribunal Federal vem, ao estudioso do Direito, a lembrança de célebre frase de Rui Barbosa, maior advogado brasileiro, defensor e crítico da Corte. Assim, em 1914, em debate com o colega Pinheiro Machado, que se insurgia contra uma decisão do STF, Rui afirmou: "Em todas as organizações, políticas ou judiciais, há sempre uma autoridade extrema para errar em último lugar. O Supremo Tribunal Federal, não sendo infalível, pode errar. Mas a alguém deve ficar o direito de errar por último, a alguém deve ficar o direito de decidir por último, de dizer alguma coisa que deva ser considerada como erro ou como verdade".
As últimas situações constrangedoras proporcionadas por atuações de ministros do Supremo Tribunal Federal, seja no mister de suas decisões, seja na atividade externa de seus membros, preocupam e algo se espera deva ser feito por quem de direito, porque, lamentavelmente, a frase de Rui Barbosa que deveria ser utilizada excepcionalmente, ou seja, desculpando eventual erro, está, nos tempos atuais, se tornando regra e não exceção.
Nos últimos tempos aquele que deveria ser considerado o mais importante e mais respeitado Tribunal do país, tendo em conta ser aquele que tem o poder de decidir sobre a constitucionalidade das leis e de atos e ser a última instância sobre decisões judiciais, passa por uma rejeição e descrédito da população. Isto porque a fragilidade intelectual e moral de alguns de seus membros, com decisões anômalas, contrárias à lei e a favor de determinados políticos. condenados em instâncias inferiores, maculam a Instituição. Gilmar Mendes, sozinho, libertou em HC dezenas de investigados por corrupção, contrariando decisões de juízes de primeira e segunda instâncias.
Além de decisões frontalmente contrárias à Constituição, ministros têm pautado seus comportamentos, fora do Tribunal, de forma totalmente contrária à lei, como o último episódio ocorrido a bordo de um avião em que o ministro Lewandowski, não concordando com opinião de um advogado, determinou que o mesmo fosse detido. Isto propiciou inúmeros protestos que, tudo indica, irão se tornar corriqueiros.
A situação é tão grave que, Modesto Carvalhosa, professor da USP e um dos mais respeitáveis juristas brasileiros, que combate fervorosamente o estado humilhante atual do STF, chega a considerá-lo "o maior inimigo do povo brasileiro e deve desculpas ao Brasil". A revolta aumentou com o julgamento do aumento de 16% para os ministros e o julgamento do indulto de Natal decretado por Temer e que beneficia condenados da Lava Jato, além de ajudar o próprio Temer futuramente.
Carvalhosa, sem papas na língua, tem entendimento de que "o Supremo Tribunal Federal está a serviço da reestruturação completa do esquema de domínio da cleptocracia no Brasil. Ou seja: o domínio dos bandidos, mandando no Brasil. Anteriormente, esses ministros que fazem parte do grupo a favor da corrupção soltavam presos que ainda não haviam sido julgados. Hoje, soltam presos que já foram julgados, condenados e encarcerados".
Carvalhosa já chegou a protocolar, perante o Senado, pedidos de impeachment de Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski.
Atualmente, grupos protestam e já realizam manifestações públicas contra os ministros do STF em algumas capitais e, se não ocorrerem mudanças, teremos fato inédito, qual seja o total descrédito da Corte mais importante do país.
O sistema brasileiro proporciona algum tipo de controle entre os poderes. Assim, o Legislativo pode realizar CPIs até contra o Poder Judiciário e o Executivo. De seus lado, o Poder Executivo tem opção de veto sobre leis aprovadas pelo Legislativo. Já o Poder Judiciário pode vetar leis que são consideradas inconstitucionais, assim como afastar governantes. O que não poderia ocorrer e, às vezes ocorre, é quando o Poder Judiciário abandona seu papel de julgar e passa a legislar, usurpando função do Legislativo.
Marco Aurélio Melo, um dos ministros mais polêmicos, já afirmou: "Não somos semideuses, somos apenas operadores do direito". Ocorre que, na estrutura atual da Constituição Federal, a "última palavra" é a do STF. E, sabedores desta realidade, alguns ministros exorbitam em decisões absurdas, geralmente beneficiando pessoas ligadas aos mesmos politicamente.  Mas, como afirmou Guizot: "Quando a política penetra no recinto dos tribunais a Justiça se retira por alguma porta". Já nosso maior jurista, Rui Barbosa, sempre preocupado com a lisura do Supremo, afirmou certa vez: "aqui não podem entrar as paixões que tumultuam na alma humana; porque este lugar é o refúgio da Justiça". E este sempre foi o sentimento da população que, agora, vê o Tribunal Maior conspurcado.
Finalmente, como o Brasil, após as recentes eleições, vive um clima de mudança em todos os setores, aguarda-se que estas também sejam estendidas à alterações significativas na estrutura e funcionamento do STF para resgatar sua imparcialidade e credibilidade. Nunca uma frase mencionada pelo mesmo Rui Barbosa, se molda perfeitamente, na atualidade, ao STF:  "A pior ditadura é a do Poder Judiciário. Contra ela, não há a quem recorrer".