É preciso esclarecer
A Prefeitura Municipal de Franca continua devendo uma resposta aos contribuintes francanos sobre a desapropriação dos imóveis no entorno da Praça do Cemitério da Saudade, no Centro de Franca. Ontem foi o prazo final para que os locatários deixassem o local. A ideia da Prefeitura é transformar o espaço, que totaliza uma área de 661 metros quadrados, em um Centro Cultural em homenagem à atriz Regina Duarte, que teria nascido em um dos imóveis. Para isso, seis proprietários de estabelecimentos comerciais tiveram que cerrar as portas e procurar um novo endereço. Afinal, até o momento a Prefeitura ainda não deu qualquer esclarecimento sobre os projetos que serão desenvolvidos no local e quanto será efetivamente gasto na reforma e adequação dos imóveis. O que se sabe, extraoficialmente, é que a municipalidade teria despendido algo em torno de R$ 1,5 milhão na desapropriação, que já teriam sido pagos ao proprietário dos imóveis. Com isso, a Prefeitura Municipal obrigou uma floricultura - que se estabeleceu no local há mais de 20 anos - a deixar o local. Com ela, mais cinco estabelecimentos (quem tinha menos tempo de comércio estava ali há três anos), sem que se entendam o critério e a necessidade destes desalojamento e investimento.
Não se discute a importância da atriz Regina Duarte para a cultura nacional. Um dos ícones da dramaturgia brasileira (atuou com brilhantismo no teatro, na televisão e no cinema), ela merece uma homenagem da terra onde nasceu, mesmo que não destaque tanto a sua Franca de nascimento em suas entrevistas.
Dona de terrenos em vários pontos da cidade, a Prefeitura poderia investir na construção, em um destes locais, do Centro Cultural “Regina Duarte”. Ou explicar por que não o faz. Por certo uma construção em terreno de tamanho semelhante ao desapropriado em outra área que não a central, eliminando a necessidade de indenização do proprietário - ficaria muito mais barata. E a falta de esclarecimentos a respeito denota descaso para com o dinheiro do contribuinte francano. Mesmo com a manifestação de queixas e questionamentos a respeito do processo em andamento, o Executivo municipal segue sem prestar contas do que examente pretende fazer, pelo menos neste caso. A existência de um projeto, a projeção de gastos e a necessidade da instalação deste Centro Cultural precisam ser explicados com mais detalhes pelo poder público, para que o francano possa acompanhar com clareza os investimentos que são feitos com o dinheiro dos seus tributos e se manifestar contrariamente se perceber alguma irregularidade. A falta de clareza torna qualquer tipo de iniciativa do poder público questionável. É preciso estar atento a isso.
Eis o meu comentário:
Oportuno o editorial do “Comércio da Franca”. Na verdade, desde a divulgação dessa estranha desapropriação os cidadãos francanos questionam quais os reais motivos que a motivaram. Como ensina nosso maior administrativista, Celso Antônio Bandeira de Mello (Curso de Direito Admnistrativo.12 ed. 2000. p.693): “Os requisitos ou condições que autorizam a desapropriação são os previstos no art.5, XXIV, do Texto Constitucional, ou seja: necessidade pública, utilidade pública ou interesse social, pagamento de indenização prévia, justa e em dinheiro, no caso da desaporopriação comum, prevista no citado art.5, XXIV, da Constituição, e em títulos especiais da dívida pública, quando se tratar de desapropriação para política urbana ou reforma agrária, nos termos e condições dos arts.182 e 184 e ss., respectivamente. A definição das hipóteses em que se reputa existente necessidade pública, utilidade pública ou interesse social cabe a normas infraconstitucionais.”
Como informa o texto jornalístico, não foram dados esclarecimentos públicos sobre a criticada desapropriação, restando ser confirmada a versão de construção de um “Centro Cultural” em homenagem à atriz Regina Duarte, ainda viva, pelo fato dela ter nascido na cidade.
Ora, não se questionando o valor pessoal da conhecida atriz, custa crer que tal motivo ensejaria a única hipótese viável de desapropriação, no caso, ou seja utilidade pública (enquadrando-se nos casos de divulgação de natureza artística). Seria forçar demais.
Por outro lado, se verdadeiro o valor citado pago, é elevado (cerca de R$1.500.000,00), por uma área de aproximadamente 600 metros quadrados. Ainda que em região central, é questionável e merecedor da fiscalização dos órgãos competentes, como Câmara de Vereadores e Ministério Público.
Novamente, voltamos a citar o prof Celso Antônio (op.cit., p.710) o qual pondera sobra a discricionariedade do Poder Público, em tais situações: “A discricionariedade dentro das hipóteses legais de desapropriação, não é, evidentemente, possibilidade aberta ao Poder Público de servir-se formalmente das expressões legais para atribuir-lhes a força de instrumento de satisfação de propósitos alheios aos que a lei protege, deseja e expressa. Ato de tal natureza configura desvio de poder e deve ser coartado pelo Judiciário através de meio eficaz, isto é, na própria ação de desapropriação, sob pena de não resultar na proteção pleiteada a valor jurídico resguardável.”
Aliás, outros assuntos já noticiados no mesmo jornal, como, por exemplo, respeitável verba autorizada sem maiores discussões pelo Legislativo, destinada à FEAC, deveriam ser objeto de maior fiscalização pelos órgãos responsáveis. Afinal, dinheiro público deve sempre ser bem aplicado. Nunca, para interesses escusos, ou em benefício de interesses particulares.