domingo, 22 de outubro de 2017

Descobrindo Portugal.

Descobrindo Portugal.

Muitas pessoas já falaram sobre costumes e curiosidades de Portugal. Mas, quando aqui se vem, pela primeira vez, certos hábitos, já relatados, se tornam estranhos ou hilários. Não só idiossincrasias, como diferenças no mesmo idioma, do vocabulário, da fonética e da sintaxe merecem destaque.
Uma jornalista portuguesa, Marisa Moura, já afirmou em livro de sua autoria ("O que é que os portugueses têm na cabeça") que "somos mal-educados em todo o sentido do que é educação". Na verdade, à primeira vista, o português comum costuma ignorar as pessoas, responde ou fala alto e demonstra impaciência em diálogos com desconhecidos.
Sua sovinice é marcante, sendo que presenciei fato curioso numa missa: uma pessoa pedindo troco na hora do ofertório!
Outros costumes, vistos em Coimbra: quase todo mundo coloca roupas lavadas para secar  nas janelas, especialmente dos prédios, fato totalmente proibido no Brasil.
Quase não se vê policiamento ostensivo, embora digam que o índice de crimes é pequeno. Como quase todos têm o hábito de fumar, não há restrições nos locais públicos, como no Brasil e, pasmem, vê-se policiais fumando em serviço. Multas de trânsito, então, não devem existir, quase todo mundo estaciona veículos nas calçadas, não há limite de velocidade em perímetros urbanos, etc. Fato a se destacar é que a maioria dos táxis é da marca Mercedes Benz, de modelos mais antigos.
Fato impressionante e que causaria ataques em promotores públicos do Brasil, é que não se respeita aqui a acessibilidade das pessoas, havendo escadas longas em todo lugar público e ausência de rampas para idosos ou deficientes físicos. Também o direito do consumidor é infringido, como em alguns lugares do Brasil, havendo um preço nos produtos nos balcões e outro no caixa, a maior. A diferença é que no Brasil prevalece o preço menor e em Portugal, caso o consumidor não queira pagar o preço maior, não leva o produto.
Já no vocabulário, telefone celular é chamado de telemóvel, ônibus é autocarro, trem é comboio, ponto de ônibus é paragem, café da manhã é pequeno almoço, padaria é pastelaria, presunto é fiambre, sanduíche de carne é prego, geladeira é frigorifico, térreo é rés-do-chão, prefeitura é Câmara Municipal.
Se você pedir um café em Portugal e não salientar que quer "um cheio", eles servem a xícara com cerca de um centímetro de líquido (o chamado "curto"), porque para eles há dois tipos. Por outro lado, se uma " rapariga" (moça) portuguesa fosse, no Brasil, e pedisse um "cacete galego" (pão, tipo ciabatta) criaria um alvoroço!
As confusões em cafés e restaurantes são comuns, afirmando Marisa Moura que os portugueses são "uns doidinhos". E, de fato, ela conta algo que aconteceu comigo: "quando pedes um café cheio e trazem-te um curto ou quando pedes um prego bem passado e trazem-no em sangue...".
Depois, criticam as piadas sobre portugueses, como aquela : "Qual é o único português que serve para alguma coisa? R.: O Manuel de Instruções".
Enfim, são impressões iniciais, na cidade de Coimbra. Espero que nas outras cidades maiores tais divergências sejam diferentes ou inexistentes.

terça-feira, 17 de outubro de 2017

Portugal: primeiras impressões.

Portugal: primeiras impressões.

"Uma das coisas que eu percebo no Brasil é que o brasileiro não tem consciência do quanto é próximo do português" (Valter Hugo Mãe)

Pouco mais de quinze dias em Portugal, na cidade de Coimbra, constato as imensas similaridades entre o país "mãe" e o Brasil. Realmente, lembro-me das aulas de história, sobre as origens, e de literatura sobre os costumes, com destaque para o impecável Eça de Queiroz. Também, neste sentido, vi muitas citações de portugueses famosos, eles mesmos surpreendentemente muito críticos, faceta que logo "se percebe", me vêm à lembrança. O grande e inesquecível Padre Antônio Vieira, em certo trecho de um dos seus "Sermões" afirmou: "Mais temo eu a Portugal os perigos da opulência, que os danos da necessidade".
Outro grande português, Fernando Pessoa (1888/1935), alertava sobre uma característica específica que, penso, ainda exista: "Se, por um daqueles artifícios cômodos, pelos quais simplificamos a realidade com o fito de a compreender, quisermos resumir num síndroma o mal superior português, diremos que esse mal consiste no provincianismo." (O Provincianismo Português (I)) .
Já o cáustico José Saramago é contundente: "Este país (Portugal) preocupa-me, este país dói-me. E aflige-me a apatia, aflige-me a indiferença, aflige-me o egoísmo profundo em que esta sociedade vive. De vez em quando, como somos um povo de fogos de palha, ardemos muito, mas queimamos depressa." (em Jornal de Letras, Artes e Ideias,1999).
São expressões literárias vindas de intelectuais de alto porte e do próprio país.
Mas, características interessantes são logo percebidas por quem visita Portugal. Coimbra é uma cidade de pequeno porte, com cerca de 140.000 habitantes, dos quais 37.000 são estudantes orbitando uma das mais famosas universidades do mundo, a Universidade de Coimbra, fundada por D. Dinis I em 1290, tendo como mais famoso aluno Luís de Camões, talvez o maior poeta mundial. A universidade, num topo de um morro, fica na chamada "cidade alta", onde os prédios históricos são a maioria. Na "cidade baixa", encontram-se os principais hotéis, logradouros e pontos onde se concentram os turistas e a população em geral.
Ao visitar a universidade sente-se o clima de um local extremamente tradicional, com atos e atitudes daí derivados, chegando os universitários, depois de dois anos, a usarem como vestimenta uma toga preta, incompatível aos nossos olhos com o calor escaldante que predomina nestes tempos na cidade. Entretanto, considera-se uma honraria a vestimenta e os alunos andam empinados a exibi-la, orgulhosos. Também, no início do ano letivo acontece a primeira festa universitária, denominada "Latada", onde os calouros ficam por quase uma semana desfilando fantasiados, batendo latas e, rodeados pelos veteranos da bata negra, anoitecem e amanhecem bebendo pelas ruas. Dizem que o consumo de cerveja é o maior do país neste período e, no último dia a cidade para e só se ouve a sirene das ambulâncias socorrendo os bebuns universitários.
Para aqueles que têm a informação da mídia brasileira de que Portugal é o destino almejado por aqueles que se sentem insatisfeitos com a situação política e econômica do Brasil, chegando alguns a dizerem que é um eldorado e a salvação, alertamos que deve-se tomar cuidado com o andar da carruagem.
Como salientado, pelo menos em Coimbra, trata-se de um país com um teor de tradições elevado, um salário mínimo pequeno, de 557 euros. Um pequeno apartamento tem aluguel de 220 euros, a passagem de ônibus (aqui denominado autocarro) é de 1,60 euros, um refrigerante 2 euros, uma refeição em restaurante simples cerca de 7 euros.
A burocracia do serviço público português é assustadora, tornando a do Brasil um oásis. Cada órgão público tem um horário próprio, geralmente fechando uma hora e meia para o almoço e, alguns encerrando as atividades às 17 horas. Os funcionários, de regra, são como aqueles que tanto odiamos no Brasil, pouca vontade de atender, má vontade em informar, etc. Para se obter um atestado de residência tem-se de providenciar a assinatura de dois comerciantes do bairro onde a pessoa vai morar. Quem chega na cidade, sem conhecer ninguém, tem de ter coragem e solicitar aos primeiros que encontra. No nosso caso, tivemos a sorte de encontrar o sr. Borges, do Café e Cervejaria Borges, pessoa inicialmente avessa, ex-morador de Moçambique, mas que, uma vez adentrado na conversa, torna-se simpático, fala da fama de seu café, onde, dizem, há as melhores "bifanas de galinha" e as melhores "tostas" (os nossos tostex) de Coimbra. Segundo Borges, famosos, que ele diz serem amigos, como o ex-craque da seleção portuguesa Eusébio, o "Pantera Negra", moçambicano do Benfica, que brilhou na Copa de 1966 ofuscando até o nosso Pelé, já frequentaram seu estabelecimento. Borges não só assinou o documento para obtenção do atestado de residência, como também indicou uma comerciante vizinha para completar a exigência.
Em relação à saúde, os centros de atendimento à população em geral correspondentes aos nossos Nubs e UBS, são permeados pela burocracia, funcionários estressados e prédios em sofrível estado de conservação. Aliás, é outra característica marcante da cidade. Não só os prédios antigos, mas também os recentes, demonstram pouco interesse na pintura, ficando quase que uniformizados em feiúra.
Um destaque negativo português é o excessivo consumo de cigarro por todos locais, inclusive nas proximidades de bares e restaurantes, ao contrário da situação atual do Brasil, onde em muitos lugares tal vício foi banido acertadamente.
Quanto à alimentação, que muitos me relataram ser maravilhosa, com realce para os pratos à base de bacalhau, sardinha e outros peixes, além dos famosos doces e pães, tenho a informar que, até o momento, posso confirmar que pães iguais não encontrei ainda, a não ser na imbatível França. Já os doces, embora ainda não conheça muitos, reconheço que são marcantes. Os pratos de bacalhau, ainda estou à procura de algum que seja melhor dos que são encontrados nos melhores restaurantes de São Paulo. Bem, há os vinhos, inclusive o famoso do Porto. Mas, por enquanto, ainda não caíram nas minhas mãos e podem ser objeto de comentário à parte.
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