segunda-feira, 15 de julho de 2019

Bolsonaro não foi eleito para tal

O assunto da semana foi o comunicado de Jair Bolsonaro, no dia em que seu filho Eduardo completava 35 anos, de que pretendia indicá-lo para o cargo de embaixador do Brasil nos EUA. Para ele, a amizade do filho com os filhos de Trump, saber falar inglês e espanhol, ter feito intercâmbio, seriam credenciais para a pretensão. Ouvido, Eduardo completou que, além daquelas qualidades, também sabia "fritar hambúrguer", o que teria aprendido em suas passagens pelo EUA.
Bem, para quem votou em Bolsonaro para que o mesmo mudasse a política antiga e viciada, baseada em corrupção e benesses aos parentes e amigos, isto soou como uma blasfêmia!
À primeira vista, incrédulo, pensei que seria mais uma fanfarronice do presidente que, sempre se espelhando em Trump, teria feito um "balão de ensaio" para ver as reações. Mas, houve a confirmação da pretensão de pai e filho, ainda embasados na corrente que entende ser medida legal, por existirem precedentes esparsos do STF em contrariedade à Súmula 13 que proíbe nepotismo.
Cumpre notar que a divergência é da 2.ª Turma, aquela que é formada pelos ministros mais polêmicos. E que, o ministro Marco Aurélio, de pronto, já se manifestou pela tese do nepotismo.
Importa salientar que o artigo 37 da Constituição Federal determina que as contratações de funcionários para cargos públicos devem cumprir os princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. Neste caso, há patente afronta ao princípio da moralidade. E, diga-se, nepotismo é termo utilizado para designar o favorecimento de parentes ou amigos próximos em detrimento de pessoas mais qualificadas, geralmente no que diz respeito à nomeação para cargos públicos e políticos.
No caso em questão, a pessoa para alçar o cargo de embaixador, pelas vias normais, tem de se submeter ao rigoroso concurso do Itamaraty e percorrer uma carreira de excelentes serviços por 10 a 20 anos de exercício da carreira de diplomata. Na verdade, atualmente, cerca de mais de mil diplomatas teriam condição de exercer o cargo final da carreira, o de embaixador. E mais. Especificamente em relação aos EUA, trata-se da embaixada mais cobiçada e que foi tradicionalmente ocupada (com exceção dos governos petistas e de Temer) pelos diplomatas mais gabaritados, seguindo a tradição de pessoas como o Barão do Rio Branco e Joaquim Nabuco (este, o primeiro embaixador em Washington, em 1905), para dizer sobre os mais famosos. Aliás, cabe, no caso, uma frase de José da Silva Paranhos Júnior, o Barão do Rio Branco: "a política externa não pode se dobrar à política partidária [...], a diplomacia é atividade para diplomatas profissionais e não para políticos".
A pretensão de Bolsonaro vai esbarrar na suposta falta de autorização do Senado e, possivelmente, numa proibição do STF, causando-lhe danos políticos.
Realmente, o Presidente deveria aproveitar a imensa votação obtida nas eleições, o apoio popular existente e a confiança que conseguiu da população, que acreditou em suas propostas, para cristalizá-las e não, ao contrário, atuar como um barco sem rumo, e tomar decisões sem fundamento como esta que surgiu. Deveria, sim, atentar a um conselho de um dos maiores diplomatas dos EUA, Henry Kissinger, que pontuou: "se você não sabe para onde está indo, todo caminho o levará a lugar nenhum".