domingo, 15 de maio de 2016

Impeachment: fim da segunda etapa, que o desfecho não demore.

Impeachment: fim da segunda etapa, que o desfecho não demore.

O impeachment surgiu na Inglaterra, no reinado de Eduardo III, no século XIV. Inicialmente, destinava-se a robustecer o poder parlamentar, de apuração de responsabilidades, política e criminal, dos funcionários de alta categoria, estendendo-se desde o séc. XIV aos Ministros. Tendo sido adotado por algumas colônias, foi incorporado à Constituição norte-americana, aí já contra presidente, vice-presidente e demais funcionários ("against the president, vice-president, and all civil officers of the United States", art.II, sec.4). Interessante que, nos EUA, no ínício, o impeachment abrangia atos genéricos e vagos, sendo suscetíveis de impeachment "treason, bribery, or other high crimes and misdemeanors" (art.2. sec.4). Também, desde o início, lá como cá e nas grandes nações, o processo se inicia na Câmara e o julgamento pertence ao Senado. E lá, como cá, quando o acusado é o Presidente, o Senado deve ser presidido pelo Presidente da Suprema Corte.
Interessante notar que Montesquieu, o célebre autor do "Espírito das Leis", nas suas teorias sobre as formas de governo e ao analisar a importância da divisão dos três Poderes: Executivo, Legislativo e Judiciário, frisava que "todo homem que tem Poder é levado a abusar dele", havendo necessidade de se encontrar limites. Daí que a divisão dos Poderes, entre outras coisas, "serve para que cada Poder freie o outro e impeça o abuso por parte deste."
Montesquieu, apesar de propor esta divisão de Poderes que visava o controle sobre os abusos de cada um, era reticente quanto ao processo contra o chefe do Executivo, aceitando-o apenas quanto aos ministros: "Estes podem ser processados e punidos; mas, não aquele, o chefe. Sua pessoa deve ser sagrada, por ser necessária ao estado, para frear o legislativo".
Na esteira de tal pensamento, a doutrina antiga nacional também via com reserva o impeachment, chegando um autor clássico, Francisco Sá Filho (Relações entre o os poderes do Estado. Rio de Janeiro: Borsoi, 1959. p.171), a afirmar: "o impeachment desmoraliza o poder público e desacredita o país, que o pratica tornando-se um mal maior do que o remédio".
Independente de tais opiniões relevantes, o impeachment se manteve ao longo dos anos e em todas as nossas Constituições republicanas se fez presente. É utilizado para julgar o Presidente, nos crimes de responsabilidade, perante o Senado, ficando os crimes comuns a cargo do Supremo Tribunal Federal.
O processo de impeachment é considerado de natureza mista, tanto política, como criminal.
O impeachment da presidente Dilma teve vários aspectos que o antecederam e que o qualificaram. Marco inicial foi a reeleição da mesma que, tendo conhecimento da situação crítica da economia, mascarou-a e escondeu fatos gravíssimos denominados "pedaladas fiscais", onde infringiu a Lei de Responsabilidade Fiscal em artigos que têm caráter de crimes e efetuou toda a campanha baseada em fatos falsos e otimistas levando a população a ser fraudada politicamente. Paralelamente, cresceram as investigações da Operação Lava Jato, onde a menção às atuações da presidente, de seu antecessor Lula, de seus assessores mais próximos vieram a corroborar a situação da vigência de uma verdadeira organização criminosa que assumiu as rédeas do Poder na nação e que patrocinava a corrupção amalgamada ao poder.
Tudo isto chegando ao conhecimento da população proporcionou constantes manifestações populares que forçaram o Congresso a tomar atitude no sentido da aceitação do pedido de impeachment feito na sua forma mais correta de início, qual seja, a do pedido de um cidadão. Vários cidadãos protocolaram seus pedidos junto à Câmara dos Deputados (mais de trinta), mas a presidência houve por bem acatar aquele assinado pelos professores Janaína Pascoal, Miguel Reale Júnior e Hélio Bicudo.
É bom acrescer que, ao lado dos crimes fiscais cometidos pela presidente, o país vivia uma crise de não-governabilidade, produto de uma crise de má gestão administrativa, aliada a uma crise de falta de apoio político à presidente, não só pelos congressistas, como também pelos cidadãos e autoridades. Some-se a todos estes problemas, a incrível crise econômica e o crescimento alarmante e progressivo do desemprego. Ou seja, bomba atômica!
É importante lembrar, com Norberto Bobbio, Nicola Matteucci e Gianfranco Pasquino (Dicionário de Política, 8. ed., v. 1. Brasília: UNB, 1995. p.549) que: "Somente o Governo que se baseie na sua eficácia e no consenso público e, na verdade, um Governo plenamente legítimo; mas, de maneira crescente, nos sistemas políticos contemporâneos, a legitimidade  é o resultado de serviços governamentais que satisfaçam todas as exigências dos vários grupos sociais." E, como demonstraram as recentes manifestações populares, Dilma não vinha preenchendo tais requisitos, além de ter coonestado com a corrupção que campeia no país.
Quanto à legalidade da medida, cumpre realçar que a OAB nacional e, também, em decisão tomada pelos presidentes estaduais do órgão, apoiou incondicionalmente o impeachment. E o Presidente da OAB nacional assim se expressou: "Ampla consulta à advocacia brasileira concluiu, em uma decisão quase unânime, que as pedaladas fiscais são motivo para impeachment. A análise feita pelos representantes das advogadas e dos advogados do país foi técnica-jurídica, não foi política. A conclusão deste trabalho mostrou que, além das pedaladas, há outras justificativas legais para o impeachment: as renúncias fiscais ilegais para a Fifa, a tentativa de interferência no Judiciário e o uso do cargo para beneficiar um aliado político com as prerrogativas de ministro de Estado." (O Brasil após o impeachment. Cláudio Lamachia. Presidente nacional da OAB. Portal da OAB.11.05.2016).
Portanto, a decisão do Senado, ao admitir o processo de impeachment, somente cumpriu com as exigências sociais e legais apresentadas. O prazo estipulado de 180 dias é suficiente, mas longo, dentro da situação atual do país. Para que o vice presidente possa ter tranquilidade para tentar reerguer as ruínas deixadas, mister que a decisão final sobre o impeachment seja abreviada o mais rápido possível para que a "sombra" deletéria da presidente afastada não macule e impeça o desenvolvimento normal das medidas duras que serão apresentadas e que não permitirão questionamentos da ala que foi destituída e que, tão logo, foi afastada, já se propôs a criar problemas.
Que o Senado agilize o processo para o bem do Brasil!