domingo, 26 de agosto de 2018

As eleições e as dúvidas.


Aproximam-se as eleições e o que paira no ar é um vendaval de dúvidas. Em queda vertical, há muitos anos, no espírito do cidadão, o ato de votar não inspira mais aquele dogma de sua origem, qual seja o ato supremo da escolha de um representante que defenda as boas causas do eleitor, visando o bem comum da população.
Após sucessivas decepções, causadas por eleitos que não cumpriram suas promessas, seja por não apresentação de bons projetos, seja por participações em corrupções as mais diversas, o eleitor sofre de um marasmo e descrédito no ato maior da cidadania, especial oportunidade de sufragar um escolhido que o represente.
É bem verdade que, por tradição, desde o primeiro período da República, conviveu-se com pouca credibilidade nas eleições, constantes que eram as fraudes. Assim, comentando sobre A Primeira República, o historiador Boris Fausto (História Concisa do Brasil. São Paulo: Ed. Edusp, 2001. p.199) já afirmava: "A fraude eleitoral constituía prática corrente através da falsificação de atas, do voto dos mortos, dos estrangeiros, etc. Essas distorções não eram aliás novidade, representando o prolongamento de um quadro que vinha da Monarquia".
Recentemente, colocou-se em dúvida o resultado das eleições de 2014, com denúncias veladas de fraude que teriam beneficiado Dilma. A tentativa de modificação da forma de votação não encontrou guarida e manteve-se a forma da urna eletrônica para as próximas eleições, apesar de muitos especialistas vislumbrarem possibilidades de ocorrência de fraude.
A existência de muitos candidatos, com pouca qualidade e inúmeros questionamentos, torna a eleição presidencial um horizonte assustador. Realmente, há candidatos na categoria de veteranos, como Ciro Gomes, Geraldo Alckmin, Marina, Álvaro Dias, com discursos de política superados, além de terem apoio de políticos condenados ou investigados por corrupção. De outro lado, novos aspirantes, como Boulos, Amoedo e Jair Bolsonaro, este não tão novo, em que dois defendem políticas opostas e radicais e um que não tem qualquer tradição no ramo, apesar de se proclamar "novo", completando um quadro desalentador.
Além disso, fruto da decadência marcante da Justiça Eleitoral, acelerada pela gestão de Gilmar Mendes que, contra toda a legislação manteve a chapa Dilma-Temer no mais vergonhoso julgamento daquela Corte, possibilitou-se o registro de uma candidatura ilegal, a de Lula, pessoa condenada e já de antemão considerada inelegível, fato que só serve para confundir o eleitor mais simplório e macular as eleições.
Uma incógnita surge em relação ao PT. Embora a operação Lava Jato tenha desmoralizado quase todos os grandes partidos políticos, o PT principalmente, este partido sempre se caracterizou por adeptos fanáticos. Para um pesquisador norte-americano, David J. Samuels, professor na Universidade de Minnesota, EUA, comentando um estudo seu, na BBC News Brasil, ao contrário daqueles que pensam que os eleitores votam em pessoas, a força do partido não deve ser desprezada: "Na cabeça dos eleitores, a divisão entre petistas e antipetistas é uma força poderosa que pode moldar o resultado da eleição, independentemente de (o ex-presidente) Lula ser candidato ou não", diz. E mais: "entre 20% e 25% da população não vai votar no PT de jeito nenhum. Mas também sabemos que entre 20% e 25% dos eleitores têm uma probabilidade extrema de votar em qualquer candidato do partido", afirma.
Ou seja, neste mar de dúvidas e incertezas, percebe-se que, provavelmente, os meios que influenciam a opinião pública, como ensinam os cientistas políticos, terão um papel preponderante no pleito. Conforme ensina Paulo Bonavides, em seu Ciência Política (22. ed. São Paulo: Malheiros, 2015. p.500): "Os jornais, as estações de rádio e televisão, a Internet, seus redatores, seus colaboradores, seus comentaristas, escrevendo as colunas políticas e sociais, programando os noticiários, preparando as emissões radiofônicas, fazendo os grandes êxitos da televisão, constituem os veículos que conduzem a opinião e a elaboram (quando não a recebem já elaborada, com a palavra de ordem, que 'vem lá de cima'), pois as massas, salvo parcelas humanas sociologicamente irrelevantes, se cingem simplesmente a recebê-la e adotá-la de maneira passiva, dando-lhe a chancela de 'pública' ".
A grande verdade é que os tempos reclamam uma mudança na forma da democracia.
A democracia direta foi criada na Grécia Antiga, na qual não havia representantes e cada cidadão participava diretamente da política. A administração feita pela própria população permitia maior controle de votos e responsabilização dos cidadãos, que tinham o dever de estudar razoavelmente os temas a fim de tomar decisões, já que cada voto poderia alterar a direção de alguma política pública.
Esta maneira grega de democracia direta talvez seja a inspiração de uma nova forma que já existe em alguns países da Europa, a denominada "democracia líquida". O conceito de democracia líquida resgata a maneira cidadã de fazer política, trazendo os problemas sociais e discutindo-os junto à população. Mas isso não seria feito por meio de audiências públicas ou consultas populares, mas por meio da internet - mais especificamente de um website. A fim de retomar o protagonismo dos cidadãos na tomada de decisões e de tirar a ideia de que o voto é o depósito total de confiança em
um político profissional, existiria uma plataforma online em que todos os cidadãos poderiam discutir, opinar e votar em projetos de lei, por exemplo.
Mas nessa plataforma há também a opção de escolher alguém em quem você confia para tomar certa decisão por você. Ou seja, em vez de sempre ser o político profissional que você elegeu agindo em seu nome, pode ser você mesmo ou qualquer outra pessoa a fazer isso. Por exemplo, no caso de uma proposta de lei que tenha a ver com o meio ambiente e você tem um professor de biologia que tem muito conhecimento de causa ou um amigo biólogo que saiba mais do que você, você pode delegar seu voto para essa pessoa nesse assunto. Quando aquela pessoa for votar, votará por duas. Você também poderá retomar seu voto quando julgar necessário. Enfim, há inúmeras opções neste novo conceito de democracia, devendo ser num futuro próximo uma alternativa válida para o fracasso do modelo atual.
O que importa, no momento, é saber da importância do voto. A OAB nacional, inclusive, tem uma campanha louvável, intitulada "Não esqueça, voto tem consequência", que visa valorizar o voto a partir da conscientização acerca da importância da escolha de representantes institucionais: "A eleição é a oportunidade de banir os maus políticos da vida pública. Não podemos esquecer que a corrupção na política tem raízes na negligência e inconsciência da população exercer o voto. Os políticos hoje presos chegaram aos cargos que exerciam pelo voto. Tudo começa com o voto".

sábado, 4 de agosto de 2018

Trovoadas e vexames na Central das Eleições.

A GloboNews acaba de realizar uma série de entrevistas com os candidatos às eleições presidenciais. Ouviu cinco dos mais cotados nas pesquisas eleitorais: Álvaro Dias, Marina Silva, Ciro Gomes, Geraldo Alckmin e Jair Bolsonaro. Todos políticos da velha guarda, experientes, calejados e, pelos menos, dois, muito polêmicos, Ciro e Jair. Para tal, armou um círculo, composto de seus mais destacados jornalistas (Camarotti, Merval, Conti, Valdo, Lobo, D'Ávila, Gabeira, Sadi), tendo Miriam Leitão como âncora. De início, percebe-se que o número de entrevistadores contribuiu para a dificuldade de controle das perguntas que, às vezes, colidiam umas com as outras, facilitando aos experientes políticos se aproveitarem para estenderem suas respostas, o que comprometia os esclarecimentos.
Tais entrevistas ocorreram após os entrevistados terem sido ouvidos em outro programa, da televisão Cultura, Roda Viva e, portanto, sem ineditismos. caracterizando  quase que uma repetição de manifestações.
No meu modesto ponto de vista, ocorreu o esperado. Álvaro Dias, como é de seu feitio, ouvido, esquivou-se de assuntos e tergiversou sobre muitos. Marina Silva foi horrível, aliás, característica marcante de seus pronunciamentos, fracos e indeterminados. Ciro Gomes, agora contido, procurou fortalecer suas posições quase sempre inflexíveis de uma esquerda light e própria. Geraldo Alckmin, que outrora tivera um bom início na política, pós Mário Covas, e que, posteriormente, virou para o lugar comum, teve dificuldades para esclarecer seu atual posicionamento em coligar-se, antes das eleições, ao que de pior existe nos quadros de políticos marcados por condenações da Operação Lava Jato ou com processos em andamento. No entanto, e apesar de tudo, penso que conseguiu passar a ser um dos dois a figurarem no segundo turno das eleições.
Por fim, Jair Bolsonaro, o último a ser ouvido, graças a uma estratégia em que trocou o dia com Alckmin, esteve, surpreendentemente muito bem, não deixando de responder nenhuma indagação dos entrevistadores que, lamentavelmente, se saíram muito mal, apanhando seguidamente pela errada elaboração dos questionamentos. Tanto é verdade que, naqueles assuntos em que a posição de Bolsonaro é controvertida, não souberam explorar os temas e, quando o assunto chegou aos preconceitos de gênero, foram ridicularizados quando o entrevistado, ao posicionar-se sobre opção sexual, alegou não ter nada contra as escolhas, afirmando que ninguém também sabia das suas. Questionado, humilhou Camarotti e D'Ávila, sentados um ao lado do outro, afirmando que "não teria nada com isso se os dois fossem namorados", pilheriando apenas em relação à feiura de ambos. Na mesma esteira, e em seguida, ao responder a Merval Pereira, que afirmou que o próprio Bolsonaro admitia sobre questionamento de sua opção, respondeu comicamente que, se fosse só pela aparência, ele também poderia ter dúvidas sobre a opção de Merval. Ou seja, foi um deboche só, num programa que perdeu a oportunidade de trazer para os eleitores as propostas reais dos candidatos em troca de insistência em assuntos polêmicos e sensacionalistas. Ficou a impressão que os entrevistados souberam ludibriar os entrevistadores e obtiveram aquilo que almejavam: apenas a visibilidade em um veículo de grande comunicação.
O "grand finale" da situação vexatória ocorreu com a afirmação de Bolsonaro de que o jornal O Globo, em manchete e editorial da época, através de seu diretor presidente, havia declarado irrestrito apoio aos militares no golpe de 1964. O desmentido de Miriam Leitão, ao final, lendo texto da direção, constrangida , com voz embargada e trêmula, somente piorou o resultado, uma vez que não desmentiu a afirmação.
Enfim, penso que embora os entrevistados tenham deixado de manifestar aquilo que os eleitores esperavam ouvir, no balanço final, parece que Bolsonaro e Alckmin saíram na frente, constituindo-se naqueles dois que deverão disputar o segundo turno. A conferir.