quinta-feira, 3 de junho de 2021

Da necessidade do recall ou revogação politica de mandato

Temos vivido tempos sombrios da administração pública nacional. Estão se tornando cada vez mais frequentes as insatisfações populares em relação ao desempenho administrativo dos políticos, tanto na esfera federal, estadual, mas principalmente na municipal, com ocorrências de arrependimento dos eleitores quanto aos escolhidos pelo sufrágio eleitoral. 

O Brasil possui e já utilizou mais recentemente, por duas vezes, o instituto legal do impeachment, onde dois presidentes tiveram seus mandatos cassados através de julgamento legislativo previsto na Constituição e regulado por Lei especial de 1950. Impeachment é a denominação do processo político que o Presidente da República está sujeito ao praticar infrações de natureza político-administrativa, chamadas de crimes de responsabilidade, ou ao praticar condutas previstas no Código Penal e nas leis penais, os chamados crimes comuns. 

Neste sentido, surge, de modo totalmente diverso, o desejo da implementação no Brasil de um instituto que já vigora nos Estados Unidos e na Suíça, o recall político. Há uma definição simples para o mesmo: em política, recall significa o poder de cassar e revogar o mandato de qualquer representante político, pelo eleitorado. É chamar de volta para "reavaliação" popular um mandato ímprobo, incompetente ou inoperante. Como ensina Paulo Bonavides (Ciência Politica. 22. ed. São Paulo: Malheiros, 2015. p.313): "Em certos sistemas constitucionais que consagram a democracia semidireta institui-se outro mecanismo excepcional de ação efetiva do povo sobre as autoridades, permitindo-lhe por termo ao mandato eletivo de um funcionário ou parlamentar, antes da expiração do respectivo prazo legal. Esse mecanismo vem consubstanciado no chamado direito de revogação." 

Nos EUA, há a revogação individual que capacita o eleitorado a destituir funcionários, cujo comportamento, por qualquer motivo, não lhe esteja agradando. É mais utilizado no âmbito municipal. Na Califórnia e no Oregon admite-se destituição até de juízes. De uma forma geral, o processo ocorre quando determinado número de cidadãos, num montante da décima parte do corpo de eleitores,  formulam uma petição assinada, com as acusações contra o deputado ou magistrado que decaiu da confiança popular, pedindo sua substituição, ou intimando-o a que se demita do exercício do mandato.

 Decorrido o prazo, sem que haja a demissão requerida, procede-se a uma votação, onde até aquele que está sendo contestado pode concorrer com novos postulantes. Aprovada, substitui-se o contestado ou ele é mantido se a votação for rejeitada. Nos EUA, 12 estados aplicam o recall. Por outro lado, há uma modalidade, na Suíça, denominada "Abberufungsrecht", que é uma forma de revogação coletiva, não só de um mandato individual, mas de uma Assembleia total, medida adotada em sete cantões.

Sabe-se que já houve, no Brasil, algumas tentativas legislativas para tal, como a PEC n.73/2005, de autoria do ex-senador Eduardo Suplicy, e uma mais recente, de 2017, de autoria de do senador Antonio Anastasia. No entanto, ambas dormitam no aguardo de uma tramitação mais efetiva.

Seria salutar que o Congresso desse andamento a uma PEC que alterasse nossa Constituição para esta forma democrática de destituição dos políticos e funcionários mal preparados, ímprobos e ineficientes de um modo geral para o desempenho de suas atribuições. É muito frequente a situação do eleitor se deparar com o desapontamento total em relação àquela pessoa em que depositou confiança, através do sufrágio eleitoral, para o exercício das atribuições executivas ou legislativas. O mesmo poderia ocorrer em relação a juízes escolhidos da mais Alta Corte que chegam a infringir preceitos básicos da Constituição Federal a qual juraram defender.